Publicado no Tribuna do Brasil de 27/1/2007
Caderno TBPrograma, Coluna Psicoproseando...com Maraci
Outra mulher que parte deste mundo de uma das formas mais tristes que se pode ir - morta pelo companheiro. No último dia 19, Julia Maria Cruvinel Ferreira foi assassinada a facadas pelo ex-marido, que matou também um compadre que a abrigava. O duplo homicídio aconteceu na presença do filho de 12 anos do casal.
Segundo os jornais, os problemas começaram em 2000, quando Julia se separou do então marido. A partir de junho do ano passado, as ameaças tornaram-se constantes. Em oito de janeiro, ela, pelos filhos, permitiu que ele voltasse pra casa. Dez dias depois, na véspera de ser morta, procurou a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher - Deam e, pela primeira vez, registrou ocorrência contra ele. Pena que não aceitou a orientação dos policiais para que fosse, com as crianças, para uma Casa Abrigo.
A violência está em toda parte. Mas a que acontece dentro de casa é devastadora. E saber que mais uma mulher foi assassinada por alguém por quem ela um dia se apaixonou, com quem se casou e teve filhos, é tremendamente doloroso. Pior do que isso é saber que essas mortes talvez pudessem ter sido evitadas.
Não estou culpando Julia. Isso não teria o menor cabimento. Dá pra imaginar o que passava pela cabeça dela, que é o que costuma passar pela cabeça de qualquer uma nessa situação. Ela sabia que as ameaças recebidas configuravam crime e já havia consultado o Ministério Público sobre o caso. Mas daí a acreditar que aquele homem, com quem certamente viveu momentos felizes de paixão, o pai dos seus filhos, cumpriria as promessas de morte...
Segundo publicado, um levantamento feito pela Deam indica que essas vítimas levam cerca de oito anos para prestar queixa. O que acontece é que as ameaças e até as agressões leves costumam vir acompanhadas de palavras de amor, pedidos de desculpas, declarações de carinho pelos filhos, lembranças de doces momentos. É uma experiência cheia de sentimentos antagônicos. As pessoas ficam confusas. E vem a sensação de que, denunciando, podem estar exagerando e, com isso, prejudicando desnecessariamente o outro. Preocupamo-nos exatamente com quem nos ameaça. Arriscamos nossas vidas, a dos nossos filhos e a das pessoas que nos cercam.
Vivemos num mundo em que mães jogam filhas recém-nascidas em lagoas; filhas tramam a morte dos pais; netos matam com crueldade os avós. Nunca devemos subestimar uma ameaça. Minha experiência me diz que os problemas de Julia não começaram em 2000, mas ainda no namoro. Acreditando que o parceiro melhoraria, ela foi suportando, perdoando e esperando. Mas não é assim que a coisa funciona, infelizmente. A tendência é a relação ficar cada vez pior, mais perigosa.
Qualquer pessoa que ameace pode cumprir, principalmente alguém como o ex-marido de Julia, que, segundo os jornais, tinha contra ele registros policiais por lesão corporal, porte ilegal de arma de fogo, crueldade contra animais e ameaça. Assim, se você for ameaçada, mesmo que seja pela sua mãe ou por seu filho, procure a delegacia mais próxima e registre ocorrência. Não deixe pra depois. E sugiro também que, ao iniciar um relacionamento, levante a ficha policial do ser amado. Pode parecer exagero, mas não é.
Além disso, tente, o quanto antes, conhecer a família da pessoa com quem está se envolvendo. E também informações sobre relacionamentos anteriores. Essas medidas nada românticas podem salvar vidas. E, se tiver um amigo ou amiga em situação de risco, insista para que procure um abrigo. Não se exponha tentando ajudar. Em muitos casos, só a polícia poderá protegê-lo. Que essa triste história nos sirva de lição. Até sexta-feira !
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