19 de janeiro de 2009

100 dimensão

Publicado em 29/11/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro



Na semana passada, anunciei aqui que estou formando um grupo de psicoterapia para quem sofre de Transtorno Obsessivo-Compulsivo – TOC. E, como sempre acontece, várias pessoas me questionaram acerca da eficácia de um trabalho assim em comparação com o atendimento individual, enquanto outras quiseram saber o que me faz formar grupos temáticos. Às primeiras, respondi que as duas formas de terapia dão excelentes resultados, que cabe ao paciente a escolha. Às outras, expliquei que considero a terapia com grupos de pessoas que passam pelo mesmo tipo de dificuldade extremamente rica. Por isso é que, desde 1995, tenho trabalhado também dessa forma, reunindo, como no caso do Para sobreviver a um grande amor, mulheres que viveram ou estão vivendo um relacionamento problemático; do Síndrome do pânico, adultos e adolescentes perturbados por esse transtorno; e do Agora já posso contar, mulheres que sofreram abuso sexual na infância ou adolescência.

Quando pessoas atormentadas pelo mesmo problema se encontram, enxergam que não estão sozinhas e que há gente capaz de compreender a dor que sentem. Além disso, têm a oportunidade de ouvir a própria história contada por outras bocas e, a partir daí, fazer uma análise que só poderia ser feita por um espectador, alguém de fora da situação, distante o suficiente para ver com clareza. Nas sessões em grupo, cada um é atendido individualmente, na sua vez, mas tudo o que é dito naquele momento, tanto pelo terapeuta quanto pelo paciente, serve para todos, uma platéia que se beneficia dos encontros. Em situações de crise, o acolhimento, a união e um apoio firme fazem uma enorme diferença.

Isso vale igualmente para as dificuldades econômico-financeiras como esta que o mundo está vivendo agora. Um belo exemplo é o das catadoras de lixo do Riacho Fundo II que, com muita garra, criatividade, esforço, formaram a cooperativa 100 Dimensão. Ignorando todas as expectativas, elas superaram uma tremenda crise, combinação de falta de instrução, de profissão e de oportunidade. O que se passou com elas lembra muito o que acontece nos grupos temáticos de psicoterapia. Assim, vale a pena assistir ao documentário produzido pela TV Câmara e pela Fundação Banco do Brasil, que traz o sonho de Sônia Maria, vista por uma companheira como alguém de grande sabedoria e com enorme capacidade de realização, que se descreveu como uma mulher negra, com mais de 40 anos e um filho deficiente, que se uniu a um monte de gente desempregada para, juntos, montarem um negócio que lhes permitiria ganhar dinheiro e gerar empregos, dando oportunidade também a outras pessoas.

No curta, podemos assistir a depoimentos que nos falam do acanhamento inicial, do sofrimento que atinge também as pessoas mais próximas, de um começo de muito sacrifício, da necessidade de se tirar o lixo da alma, de se desfazer do orgulho, do ódio, da vaidade, da dor. Mas também há testemunhos de união, poder de decisão, clareza de pensamento, liberdade de manifestação, fortalecimento da coragem, força de vontade, dignidade. Tudo tal qual acontece com alguém que, após um período de grande sofrimento, encontra um grupo de terapia. Para o pessoal da 100 Dimensão, os resíduos não são algo que precisa ser descartado, mas reciclado. Da mesma forma, iniciado o processo terapêutico, os pacientes entendem que as dificuldades, os transtornos, os distúrbios não são algo de que precisem se livrar a qualquer preço, mas tratado corretamente.

Aquelas mulheres não apenas criaram um espaço no mercado e uma oportunidade de renda, também revolucionaram a comunidade em que vivem. Deram um rumo diferente às próprias vidas, à de seus familiares e à de todos que foram direta ou indiretamente tocados por essa força. Como elas mesmas declararam, o sentimento que as une é o de estarem em família. E quem se atreveria a dizer que não estão?

De maneira idêntica, pessoas que sofrem as mesmas dores, quer o mal seja um Transtorno Bipolar de Humor – TBH ou um câncer de mama, têm a chance de, uma vez unidas, mostrarem-se exatamente como são, de se apoiarem, de aprenderem umas com as outras, também como se estivessem em família. E quem se atreveria a dizer que não estão? Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Sugiro que assistam, no site da TV Câmara, ao documentário 100 Dimensão. A força e a capacidade de realização daquelas mulheres são um belíssimo exemplo. Não foi à toa que o curta recebeu, em 2005, o prêmio Vladimir Herzog.

Maraci Sant'Ana

12 de janeiro de 2009

Sem obsessões

Publicado em 22/11/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro

Série "O Dinheiro e os Relacionamentos" - Parte 7


Um dos textos desta série recebeu da leitora Marta o seguinte comentário: “... nesses meus muitos anos de vida, presenciei muita coisa ruim relacionada a dinheiro. Vi até tentativa de assassinato por causa de grana. As pessoas precisam entender que dinheiro é importante, mas não é tudo. Eu acredito que dinheiro traz, sim, felicidade, mas desde que a nossa relação com ele seja saudável, sem obsessões...”



Marta,


Dá para imaginar seus sentimentos quando você fala que as pessoas precisam entender que dinheiro é importante, mas não é tudo. Há situações que nos deixam estarrecidos, como essa tentativa de assassinato por você mencionada. Muitos são os acontecimentos que nos chocam a ponto de mal conseguirmos acreditar, por mais que tentemos nos manter otimistas, que a Humanidade possa ter jeito. Conhece um ditado árabe que diz que Deus castiga alguns homens os enriquecendo? Se eu acreditasse que Deus pune, concordaria plenamente com o provérbio. Dinheiro tende a ser um enorme e pesado fardo.


Não ter dinheiro é difícil, principalmente num país como o nosso, em que sem ele não acessamos nem sequer o básico. Só que, nesse caso, nossa movimentação acontece naturalmente. Procuramos ganhar pelo menos o bastante para viver com dignidade. Talvez nossa maior dificuldade, nessa jornada, seja nos mantermos no caminho da legalidade e da moralidade, o que, diga-se de passagem, não é pouco.


Mas ter dinheiro é também probatório e me parece muito mais complicado porque, uma vez que não precisamos nos mexer em busca do necessário, corremos o risco de despender tempo e energia, que são preciosos, atrás do supérfluo. Além disso, ficamos expostos à tentação de seguir vivendo nossa vidinha, incapazes de olhar à nossa volta e estender a mão a alguém que precise de ajuda. Não tentar fazer o bem é pior do que fazer o mal procurando acertar.


Este mundo ainda está muito difícil. E essa realidade não escapa ao conhecimento de ninguém, nem de quem tem uma vida despreocupada. Basta abrirmos um jornal ou ligarmos a televisão para ter início verdadeiro show de horrores – gente matando diretamente por dinheiro, como nos casos de latrocínio, de matadores de aluguel, de herdeiros bárbaros; gente matando indiretamente por dinheiro, como nos desvios de verbas públicas, em que recursos que deveriam ir para saúde, saneamento básico, segurança são covardemente aplicados em mansões, carrões, viagens fantásticas.

Mas acho que, apesar de tudo, o mundo está melhorando, nós estamos melhorando. As coisas já foram piores, nós já fomos piores. E não precisamos ir muito longe, voltar 2.000 anos, para enxergarmos o quanto já evoluímos – há algum tempo, este texto nem seria publicado, pelo menos não sem cortes. Assim, chegará o dia em que teremos compreendido as leis que regem o Universo, o suficiente para vivermos em um mundo de regeneração, em que o bem supera o mal. Valeu irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

3 de janeiro de 2009

Um novo tempo

Publicado em 03/01/2009, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


Todo final de ano é do mesmo jeito – basta a gente ligar a TV na Globo para ouvir Um novo tempo, de Marcos Valle, Paulo Sérgio Valle e Nelson Motta. Parece que isso acontece desde sempre. E não vai aqui nenhuma crítica à Vênus Platinada. O tema me traz incríveis recordações e, ao mesmo tempo, um fervor de expectativas quase inexplicável, algo mágico. É uma espécie de trilha sonora da renovação da fé em dias melhores, de que tudo de ruim ficou para traz, definitivamente morto e enterrado no passado, de que o futuro já começou.

É claro que, independentemente do novo calendário, do show do Roberto, dos fogos, da roupa nova, da fitinha do Senhor do Bonfim, das sete ondas, da Missa do Galo, da lista de compromissos, da ressaca, dos votos de muito dinheiro no bolso, saúde pra dar e vender, o primeiro de janeiro não é quase nada diferente do 31 de dezembro. Para a maioria de nós, a paisagem é a mesma, impregnada das alegrias e dificuldades que vinham sendo experimentadas no ano velho. Mas a energia que nos envolve é tamanha que nos deixamos levar a ponto de acreditarmos que o ar que respiraremos no novo ano não será o mesmo do que passou.

Um bom exemplo disso é o que aconteceu com uma paciente que vinha arrastando um namoro tão sem sentido que não lhe restava ânimo nem para dizer ao parceiro que não dava mais pra continuar. E foi só com a psicoterapia que ela entendeu que, enquanto não tomasse uma providência, mais e mais cresceria a sensação de perda das forças. Só que ela resolveu pedir que ele fosse embora justamente no penúltimo dia de 2008. E quando ele lhe disse que só sairia no dia dois, ela entrou em pânico. Parecia que, se estivessem sob o mesmo teto quando soassem as 12 badaladas da última noite antes do ano-bom, a vida dela estaria irremediavelmente comprometida.

Foi preciso uma intervenção terapêutica para que a garota enxergasse que um novo tempo não depende do relógio, mas de nós, da nossa capacidade de assumirmos nossa vida, aproveitando as oportunidades que ela nos apresenta, criando as que desejamos e serenando diante do que ainda não nos é permitido, não importando se estamos em primeiro de janeiro, 13 de maio ou quatro de setembro. Podemos dizer que, para a minha paciente, 2009 começou em 30 de dezembro de 2008 e ninguém poderia mudar isso, nem mesmo o ex-namorado, ao decidir diferente do que ela havia planejado. A cada dia, com nossos pensamentos e atitudes, construímos o que virá, escrevemos o futuro. Só falta acreditarmos que, nele, todos os nossos sonhos serão verdade, não importa o quanto demore, que é só querer.

A música nos diz que hoje a festa é nossa, é de quem quiser, quem vier. Então, vamos aproveitá-la da melhor forma, ouvindo nosso coração, movimentando-nos de acordo com nossa consciência, com as Leis que regem o Universo, lembrando de agradecer a Deus, inteligência suprema e causa primeira de todas as coisas, pela oportunidade de escrevermos nossa própria vida, de sermos, além de protagonistas, autores.

E se você curte trilhas sonoras, lembre que pode tocar a música que quiser quando quiser. Um novo tempo, por exemplo, está disponível para compra e também na internet. Se é disso que precisa para aquele empurrãozinho, ouça-a quando achar que é chegada a hora, que o seu futuro já começou. Feliz 2009, irmã! Feliz 2009, leitores!

Maraci Sant'Ana