22 de dezembro de 2008

Circuit breaker

Publicado em 08/11/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro



Foi preciso o Vicente me convidar a fazer esta coluna para que eu me desse ao trabalho de procurar entender o significado de expressões como circuit breaker. Busquei informações na internet e lá encontrei que se trata de um mecanismo utilizado pelas Bolsas de Valores para interromper um pregão, ou seja, paralisar os negócios por um tempo determinado toda vez que o índice tem variação maior que um determinado nível percentual. É um mecanismo de proteção, de segurança para evitar oscilações bruscas e amenizar a situação do mercado.

Parecidas com isso são aquelas pausas imprescindíveis de que lançamos mão quando estamos discutindo com alguém e percebemos que a conversa não terá um final feliz se continuar naquele tom. É o momento em que a gente se retira pra esfriar a cabeça, respirar fundo, beber uns bons goles de água, olhar o horizonte, tomar um banho frio. Porque há conversas que, se não forem interrompidas, deixarão mágoas e remorsos, manchas que teremos dificuldade em apagar. Assim, é melhor darmos um tempo e recomeçarmos em outro momento, talvez no dia seguinte, se o problema não tiver se solucionado por si só. Muitas coisas são resolvidas durante uma boa noite de sono.

Até aí, está fácil, não? Difícil é quando as discussões são retomadas, mas não rendem. Vira e mexe, lá está o assunto em pauta. Basta que um sinalize para que o outro revire os olhos, desanimadoramente, ou solte um “Jesus, acendei a luz!”. Mesmo que a conversa inicie em tom ameno, termina virando um bate-boca dos infernos. E é esse tipo de embate que desilude, desgasta, faz a gente desejar nunca ter conhecido aquela criatura, pensar que o Universo conspira contra nós, cobrar uma explicação de Deus para a nossa desventura, invejar a vida e o relacionamento dos outros, adoecer, envelhecer antes da hora. São essas colisões que levam os casais a uma relação infeliz e à separação. A maioria dos problemas não escapa de uma boa conversa. Mas o que fazer quando eles parecem ter vindo pra ficar?

Infelizmente, nem sempre conseguimos resolver as questões com um papo franco e honesto, mesmo que estejamos dispostos a isso, porque tem gente que não sabe conversar. Há aqueles que não conseguem falar e, diante do outro, ficam paralisados, por exemplo, e há os que não conseguem ouvir, interrompendo a todo instante, gritando, concluindo pelo outro. Passa-se de uma frase mal terminada a outra, de um mal entendido a outro. E o que deveria aproximar acaba por afastar ainda mais.

Assim, quando o tête-à-tête não rola legal, costumo sugerir o diálogo por meio de carta. Quando escrevemos, somos donos do nosso tempo. Podemos colocar no papel tudo o que sentimos, sem o risco de sermos interrompidos, de deixarmos coisas pela metade ou mal ditas. Além disso, damos ao outro a oportunidade de ler nossa carta aos poucos e até várias vezes, no tempo dele, sem atropelos, sem imposições.

Mas não se trata de escrever, pura e simplesmente, o que seria dito de boca. Tem de haver uma estratégia. Proponho começar pelo começo, dizendo, por exemplo: “O que me leva a escrever é a vontade de me entender com você”. Seja sincero, verdadeiro. Diga exatamente o que pensa e o que sente sobre o assunto. E aproveite para falar como percebe o comportamento do parceiro, sem acusações, sem leituras mentais. Termine de forma amorosa e sugira resposta também por escrito.

Troquem todas as cartas necessárias à solução do problema. Mas não deixem de lado os outros assuntos. O que estiver fluindo bem no relacionamento não deve ser prejudicado em momento algum. Ao contrário, deve ser preservado. Em outras palavras, nada de se concentrar no que vocês ainda não conseguiram. É preciso ter olhos para ver e valorizar aquilo que já deu certo na relação. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

15 de dezembro de 2008

Gatos muito vivos

Série "O Dinheiro e os Relacionamentos" - Parte 6


Publicado em 1º/11/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


O assunto de hoje foi sugerido por um leitor, o Caio, que postou o seguinte comentário: “Cara Maraci, creio que um tema bem legal para você tratar nessa sua coluna seriam as disputas dentro do trabalho. É um querendo comer o outro. Vejo, na minha empresa, que as pessoas falam mal de quem ganha mais, sendo que o correto seria ver essa pessoa como parâmetro, pois indica que há espaço para todos progredirem. Por que a tendência das pessoas é de nivelar por baixo?”


Caio,

Conhece a expressão “Ninguém chuta gato morto”? Esse comportamento a que você se referiu é próprio do ser humano imaturo, ou seja, nós. Você não vê ninguém se dando ao trabalho de pichar quem está mal, ganhando pouco, gemendo e chorando neste vale de lágrimas. O alvo das maledicências é sempre aquele que está por cima. E isso independe de competência ou merecimento. Se até Jesus Cristo foi criticado, perseguido e crucificado, o que não podemos esperar do mundo, nós, pobres criaturas tão imperfeitas? Estar em posição superior, cheio de prestígio e vantagens tem um preço, como tudo na vida.

Também não é nada fácil ocupar uma posição de inferioridade nesse aspecto, mesmo que ela esteja de acordo com nosso merecimento, mesmo que estejamos conscientes de que não fazemos jus a nada melhor no momento. Porque todos temos sonhos que esbarram na falta de dinheiro – coisas que não podemos comprar, serviços pelos quais não podemos pagar, projetos sempre adiados. É dureza levar uma vida de “nãos”. E, pra muita gente, é praticamente impossível virar a própria mesa, dar um rumo diferente às coisas, melhorar.

Talvez o pior seja quando nos sentimos e somos merecedores, e passamos por uma situação bem parecida com a descrita por Lupicinio Rodrigues na música Nervos de aço, que diz o seguinte: “Você sabe o que é ter um amor, meu senhor, ter loucura por uma mulher, e depois encontrar esse amor, meu senhor, nos braços de um outro qualquer? Você sabe o que é ter um amor, meu senhor, e por ele quase morrer, e depois encontrá-lo em um braço que nenhum pedaço do seu pode ser?...”. Assim como é difícil vermos um amor nos braços de alguém que nem chega aos nossos pés, não é nada fácil olhar “pra cima” e ver, em situação de poder, gente despreparada e até mesmo pessoas que nem deveriam andar soltas por aí.

Para muitos, talvez o pior seja quando nos sentimos merecedores, não o somos realmente, e não conseguimos nos acertar com a vida na hora em que ela vem nos cobrar por tudo o que dela usufruímos indevidamente. E, para outros, talvez o pior seja quando, mesmo merecedores, assim não nos vemos, também incapazes de uma auto-avaliação sadia, e passamos todo o tempo a chutar a sorte, jogando fora excelentes oportunidades, boicotando nosso próprio sucesso, impossibilitados de sermos bons para nós mesmos.

Posição totalmente feliz, creio que não há nenhuma. Mas sempre podemos e devemos, dependendo da situação em que nos encontremos, estar atentos às críticas que nos são dirigidas, já que, em geral, nem todas são maldosas ou infundadas; buscar uma vida melhor, a exemplo de tantas pessoas incríveis que fizeram e fazem história contra todas as expectativas; cuidar para não sermos nem condescendentes nem intransigentes com nós mesmos, mas justos; e, finalmente, procurar entender que a vida pode ser dividida em coisas que já podemos mudar e coisas que ainda não podemos mudar. Se estivermos numa situação em que nada possamos fazer, o melhor é relaxar. Não precisamos apressar o rio porque ele corre sozinho. Valeu irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

8 de dezembro de 2008

Os pressupostos e os cenários

Publicado em 25/10/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro



Vocês estão lembrados da coluna do dia 11, da história da caderneta do seu Biu? Pois aquele caso deu pano pra mangas. Quando recebi a mensagem com a piada, eu a repassei pra minha irmã, Maristela, que teceu uma série de comentários a respeito da crise americana. Falou sobre os juros muito baixos durante a gestão de Allan Greenspan, do FED; da quantidade de gente que pegou empréstimo, os tais subprime de hipoteca de imóvel; da alta dos juros; da inadimplência; da ruína de tudo o que pertencia àquela cadeia de aplicações. E concluiu dizendo o quanto o planejamento é importante para um bom negócio e o quanto uma criteriosa análise de cenários e de riscos é fundamental para um bom planejamento.

Mas ela não parou por aí. Pra facilitar meu entendimento sobre ações de longo prazo não poderem se basear em pressupostos de curto prazo, ela usou o seguinte exemplo: a paixão pode ser considerada pressuposto de curto prazo. Casamento com base em paixão tende a entrar em falência logo. O ideal é que a união se baseie em amor, esse sim um pressuposto de longo prazo. E a respeito da necessidade de análise de cenários e riscos, ela usou a seguinte figura: uma mulher de 20 anos se une a um homem de 60. Daqui a 15 anos, ela será uma balzaquiana de 35 casada com um idoso de 75. Se ela decidir ter um filho dele aos 40, pelo método tradicional, o maridão, já com oitentinha, vai precisar de um bocado de Viagra. Engraçadinha, a minha irmã, não acham?

Piadinhas à parte, o que ela disse é muito sério. E, observando bem a forma como lidamos com as coisas da vida, fica claro que não temos o hábito de analisar cenários, muito menos riscos. Ao contrário, tendemos a nos prender a detalhes, em detrimento do todo, e a só visualizar o que nos agrada, esquecidos de que tudo tem um preço. O resultado disso podem ser, por exemplo, profissionais insatisfeitos. Querem ver como não é nada difícil detectarmos gente que não planejou, pelo menos não bem, a própria vida? Observe os aposentados da sua família. Há algum que parece ter perdido o lugar no mundo, que vive correndo de um médico pra outro, sempre se queixando de alguma doença? Toda família tem pelo menos uma criatura assim. E não é difícil entender o porquê.

Quando chega a hora de escolhermos uma profissão, ou mesmo muito antes disso, somos bombardeados com opiniões diversas. Sempre haverá aqueles que nos aconselharão a priorizar a estabilidade, os que nos orientarão a procurar algo que dê muito dinheiro, os que nos estimularão a buscar nossa vocação. Mas ninguém lembrará de nos dizer, por exemplo, que nem todo cirurgião plástico será um Pitanguy, assim como nem todo arquiteto será um Niemeyer, e que, pra chegarmos lá ou superá-los, precisaremos estudar muito, abrir mão de muitos outros prazeres. Também não nos dirão que nem todo profissional ficará rico e que muitos que o conseguiram tiveram de passar pelo estágio não-remunerado, pelo trabalho gratuito, pela ralação dia e noite.

Assim, quem quiser ter uma aposentadoria feliz deverá começar a planejá-la no momento da escolha profissional. E aí vão algumas dicas: se ainda não sonha com uma carreira, converse com alguém que possa ajudá-lo a pensar sobre isso, como um parente próximo ou um orientador vocacional; uma vez feita a escolha, procure conhecer a profissão, saber como está o mercado de trabalho, qual o ganho médio, as oportunidades de concurso, como seria trabalhar por conta própria. Pesquise na internet, procure quem já estiver no ramo, outros estudantes, professores; de posse desses dados, analise os prós e os contras, pra decidir se está disposto a pagar o preço que a vida cobrará pela sua escolha; se sua resposta for sim, comece a correr atrás do seu projeto, tendo em mente que você deverá se ocupar dele pelos próximos 30 anos, pelo menos.

Vejo a vocação como algo muito importante. Entretanto, se você decidir priorizar outras questões, lembre-se de que poderá fazer aquilo de que gosta como hobby e, se for o caso, a ele se dedicar plenamente após a aposentadoria. Mas, se vier a se decidir a partir dos seus desejos mais íntimos, saiba que quem faz o que gosta de fazer atrai o sucesso, tem mais chances de ficar milionário e nunca se aposenta de fato porque vive com a sensação de que não trabalha realmente. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

1 de dezembro de 2008

Síndrome de mendigo

Série “O dinheiro e os relacionamentos” – 5ª. parte

Publicado em 18/10/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro



Em mensagem a esta coluna, a leitora Ângela disse o seguinte: ”... A impressão que tenho é a de que as pessoas estão mais insensíveis, só pensam em ganhar dinheiro, ficar ricas, se darem bem na vida. Mas de que adianta dinheiro se não se tem saúde, se não se tem um grande amor? Tem gente que passa até fome para não gastar dinheiro. Para mim isso é demais, é passar dos limites”.

Ângela,

Você nos trouxe um assunto sério. Vivemos num mundo material que gira em torno do dinheiro e do que ele pode comprar. É natural que nos esforcemos para manter uma reserva, recursos de que possamos vir a lançar mão em alguma eventualidade. Mas há pessoas que parecem não ter limites. E, assim como há aquelas que gastam o que têm e o que não têm, há as que, como você mesma disse, passam até fome para economizar, literalmente apavoradas com o dia de amanhã.

São pessoas que podem entrar em pânico só de pensar em comprar ou pagar por algo, mesmo que se trate de um objeto ou de um serviço de que estejam precisando ou que seja bem baratinho. São assaltadas por pensamentos do tipo: ”Não, não preciso disso realmente”, “Isso não é para mim”, “Não posso me dar a esse luxo”, “Há outras prioridades”. Algumas só admitem adquirir mercadorias com defeito que estejam em liqüidação. E essa postura pode se estender a necessidades básicas como alimentação e cuidados médicos. Se alguém as acusa de sovinice, avareza, pão-durismo, elas logo se defendem se dizendo econômicas, precavidas. Não hesitam em recitar a fábula da cigarra e da formiga, argumentando que estão sendo conscienciosas, trabalhando no verão para ter conforto e segurança no inverno.

É claro que, de vez em quando, essas pessoas se arriscam e, contra todos aqueles pensamentos condenatórios que as perseguem, cometem alguma “loucura” como comprar um par de sapatos novos ou obturar um dente há tempos esburacado. O resultado de “tanto desprendimento” costuma ser um sentimento de culpa arrasador. Além disso, há outra particularidade – às vezes, com o parceiro ou os filhos, elas são extremamente generosas, mão-aberta, não vendo nisso nada de mais. O resultado podem ser mulheres elegantemente vestidas acompanhadas de homens trajando o terno que o pai falecido usava quando jovem, ou mães molambentas que caminham pela rua alguns passos atrás da filha patricinha que faz de conta que nem a conhece.

Uma vida assim, de privações ilógicas, é terrivelmente penosa. O estresse provocado vai destruindo essas pessoas e os relacionamentos que possam ter. E a tortura não costuma arrefecer com o passar dos anos. Ao contrário, a tendência é o agravamento da necessidade de fiscalização e controle. Se investigarmos a vida dessas criaturas, poderemos encontrar, mesmo nesta vivência, sem a necessidade de maior aprofundamento, situação de privação material. Mas certamente encontraremos situação de privação emocional.

A Síndrome de mendigo é uma doença e como tal deve ser tratada. Assim, quem achar que se enquadra no que aqui está descrito, deve procurar ajuda. Podemos até lidar com uma infância ou adolescência de pouco dinheiro, mas dificilmente superaremos com naturalidade a falta do amor que nos teria ajudado a nos transformarmos em adultos emocionalmente saudáveis. Valeu, Ângela! Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

24 de novembro de 2008

A manobra do seu Biu e os investimentos não-financeiros


Publicado em 11/10/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


“Isso é uma forma didática de explicar a crise americana: O seu Biu tem um bar, na Vila Carrapato, e decide que vai vender cachaça "na caderneta" aos seus leais fregueses, todos bêbados, quase todos desempregados. Porque decidiu vender a crédito, ele pode aumentar um pouquinho o preço da dose da branquinha. O sobrepreço é o que os pinguços pagam pelo crédito. O gerente do banco do seu Biu, um ousado administrador com emibiêi, decide que as cadernetas das dívidas do bar constituem, afinal, um ativo recebível, e começa a adiantar dinheiro ao estabelecimento tendo o pindura dos pinguços como garantia. Mais adiante, uns seis zécutivos de banco lastreiam os tais recebíveis e os transformam em CDB, CDO, CCD, UTI, OVNI, SOS, PQP ou qualquer outro acrônimo desses usados pelo economistas e afins, que ninguém sabe exatamente o que significam. Esses adicionais instrumentos financeiros alavancam o mercado de capitais e conduzem a operações estruturadas de derivativos, na BM&F, cujo lastro inicial ninguém conhece - as tais cadernetas do seu Biu. Esses derivativos são negociados como títulos sérios, com fortes garantias reais, no mercado de 73 países. Até que alguém descobre que os bebuns da Vila Carrapato não têm dinheiro pra pagar as contas. O Bar do seu Biu vai à falência e toda a cadeia se dana.”

O texto acima me foi enviado por um amigo da época da Caixa, o Luis Guadanhim. Desconheço a autoria, mas reconheço que ele é ótimo, inclusive porque mostra como uma manobra banal, que todo dono de boteco conhece, pode gerar um problemão. No caso, o seu Biu calculou mal ou nem calculou os riscos de vender fiado. As vendas certamente aumentavam, já que os fregueses, empolgados com a facilidade de não precisar pagar à vista, bebiam cada vez mais. Em contrapartida, as chances de ele vir a receber só diminuíam. Os bebuns que estavam empregados caminhavam a passos largos para o desemprego; os que estavam desempregados viam as oportunidades de emprego passarem lá longe. O resultado disso poderia ter ficado restrito à falência do seu Biu e à desgraceira dos fregueses. Mas a coisa foi mais longe.

O gerente do banco em que seu Biu mantinha conta, já fazendo planos com o dinheiro que acreditava poder ganhar com a tal caderneta, resolveu entrar no negócio, mas parece também não ter analisado o cenário, prendendo-se apenas aos recebíveis, que aumentavam a cada dia, graças à desgraça dos cachaceiros. E os tais dos zécutivos, então, nem se fala - ouviram o galo cantar, mas não se preocuparam em saber onde. Acreditando que o gerente tinha descoberto o negócio da China, incrementaram uma cadeia de transações a partir do quê? Eles não sabiam, mas a partir da expectativa de que bêbados desempregados ou prestes a perder o emprego honrem dívida de boteco. Por mais que os fregueses do seu Biu lhe fossem leais, e por menos que eles tivessem a intenção de lhe dar o calote, não dava pra confiar nessa bondade por muito tempo, não é mesmo? Como disse a minha irmã, Maristela, ações de longo prazo não podem se basear em pressupostos de curto prazo.

Resumindo, toda aplicação exige planejamento, que não pode prescindir da análise de cenário e risco. Isso vale pra investimentos financeiros ou não. Se você pensa se casar, por exemplo, fique atento! Observe o namoro. Se ele vai bem, as coisas estão fluindo, o casamento pode dar certo, embora não haja total garantia. Se o casamento vai bem, as coisas estão fluindo, ter filhos pode ser enriquecedor, embora também não haja total garantia. Os prós e os contras exigem respeitoso exame e cada fase requer uma nova análise porque a decisão de incrementar uma cadeia demanda embasamento. E nada de dar uma de zécutivo, bancando a maria-vai-com-as-outras. O mundo está lotado de gente que, por imprudência, baseada em pressupostos de curto prazo, quebrou a cara tal qual os bancos americanos. Valeu, Guadanhim! Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

17 de novembro de 2008

As máscaras e a lava

Série “O dinheiro e os relacionamentos” – 4ª. parte

Publicado em 4/10/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


Desde 23 de agosto, quando foi publicada a 1ª parte da série, chegam comentários inspiradores. Um deles foi postado pela leitora Sandra, que disse o seguinte: “... acho dinheiro muito bom. E, em minha opinião, não é ele que interfere na vida das pessoas. Simplesmente o dinheiro revela o caráter das pessoas. Quem tem caráter continua a ser uma pessoa correta, independentemente da quantidade de dinheiro que tem. Agora, os que são mau-caráter se revelam rapidamente quando o dinheiro entra no meio.”

Sandra,

Há muitos anos, quando ainda cursava Psicologia, um professor me disse que a gente não conhece o parceiro quando com ele se casa, mas quando dele se separa. Em outras palavras, é nos momentos de crise, ou seja, de desequilíbrio, dúvidas, tensão, conflito, transição, que as pessoas se mostram como são. Temos, então, a oportunidade de saber se e, também, o quanto a criatura que se nos apresenta naquele momento tem a ver com aquela que acreditávamos que ela fosse. Tudo pode acontecer! Em situações como a que você citou, dizemos que a pessoa se revela como é verdadeiramente.

O ser humano é gregário por natureza. É na vida em sociedade que aprendemos e ensinamos. E graças a essa troca é que efetivamente crescemos. Só que, para conviver, precisamos desenvolver algumas características que, aqui, chamarei de máscaras. Sem elas não seríamos pelos outros suportados, assim como também não toleraríamos nem sequer nossos pais e filhos, pelo menos não no nível em que o conseguimos agora. Sem as máscaras que hoje usamos, as relações seriam mais tumultuadas. São elas que nos permitem aceitar os outros e sermos aceitos pelos diversos grupos a que pertencemos.

Entretanto, apesar da óbvia utilidade, as máscaras não costumam ser bem-vistas. Com elas vem a idéia de fingimento, de algo artificial, não-natural. E, considerando que somos seres da natureza, a de que elas não se sustentam todo o tempo ou em qualquer situação. Sempre chega o momento em que caem, por não terem o poder de anular, apenas de disfarçar o que em nós é incompatível com a vida em comum. Assim, tal qual a lava no momento da erupção, tudo o que se tentava esconder sob a máscara vem à tona. Creio que foi isso o que você quis dizer quando escreveu que as pessoas revelam, rapidamente, seu caráter mau.

Temos aqui duas idéias – a de máscaras e a de lava. Ambas nos incomodam porque deixam claro que os seres humanos temos uma parte aceitável, mas também uma inaceitável. E, por mais que nos consideremos sociáveis, não podemos negar que temos nossos “pecados”. Como todo mundo, em alguns momentos, em determinadas situações e com certas pessoas, somos admiráveis. Em outras oportunidades, somos horríveis, podendo ter comportamentos idênticos àqueles que não suportamos nos outros, que tanto nos incomodam, indignam.

As máscaras são instrumentos de que lançamos mão para caminhar da forma menos rude possível até que delas não mais precisemos. E a lava é que indica, com precisão, sem rodeios, as máscaras que nos estão faltando e o que necessitamos mudar em nós mesmos. Se eu acreditasse na existência do mal, diria que ele não habita nem as máscaras nem a lava, já que tudo está a serviço da nossa transformação em criaturas plenas. Valeu, Sandra! Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

9 de novembro de 2008

Ou não

Publicado em 27/9/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


“No mercado acionário, é preciso estar preparado emocionalmente para enfrentrar as adversidades.” Essa frase é destaque da coluna do professor e consultor de investimentos Mauro Halfeld, publicado na revista Época de 11 de agosto em resposta a pedido de orientação feito por um leitor que se confessou apavorado por ver seu dinheiro evaporar a cada dia. Segundo Halfeld, quem investe em ações costuma comprar na alta e vender na baixa porque pouca gente aceita ser solitária; é difícil manter uma estratégia que vá na contramão do mercado – comprar pechinchas quando todos estão vendendo e vender quando todo mundo está indo às compras; mas quem tiver sangue-frio e convicção em relação a sua estratégia, além de desprendimento para enfrentar o barulho da multidão, provavelmente colherá bons resultados.

Essa conversa de contramão me fez lembrar uma outra que tive recentemente com minha irmã. Estávamos rindo de algo de que já não me recordo quando lhe disse que, quando era bem jovem, sonhava ter um marido; depois que tive meu filho, passei a fantasiar um marido que também fosse pediatra; alguns anos depois, comecei a idealizar um que fosse cirurgião plástico; hoje, acho que o mais indicado seria um psiquiatra; e alguma coisa me diz que, se eu tiver sorte, chegará o dia em que pedirei a Deus um geriatra para marido. Será que isso significa andar na mão?

Ao ouvir isso, minha irmã, ponderou que estava tudo errado e que minha primeira mancada tinha sido sonhar com um marido. Se eu não tivesse tido nenhum, talvez nem tivesse filho e, portanto, não fantasiaria um pediatra. Também talvez houvesse me sobrado mais tempo e dinheiro para simplesmente pagar um cirurgião plástico e um psiquiatra que, de repente, nunca chegassem a ser realmente necessários. Esse papo dela me deixou meio na dúvida. Estaria ela certa? Será que isso é que não significaria andar na mão?

Mas, daí, fiz outro raciocínio – se eu já não precisasse de um psiquiatra quando era bem jovem, talvez nunca tivesse desejado um marido, ou filho, ou pediatra ou cirurgião plástico. Se a gente parar um pouquinho pra pensar, isso tudo é coisa pra doida e uma mulher só entra nesse rock and roll se estiver muito pirada, ou não, como concluiria o grande filósofo Caetano Veloso. Será que isso é que é andar na contramão?

Como vocês já devem ter sacado, para casar, assim como para aplicar na bolsa, a gente precisa ter estratégia, convicção, desprendimento, fé no futuro, coração forte e paciência para manter os objetivos de longo prazo e não sair na hora errada. E, se você já estiver casada, pense que, até no mercado financeiro, mais cedo ou mais tarde, a razão acaba por voltar. Assim, o mesmo deverá acontecer na sua vida, a você, ou não.

Estão achando que me esqueci do geriatra, não é mesmo? Pois estão enganados. Esse a gente deve começar a freqüentar o quanto antes. Assim, pouco trabalho a ele daremos, quando dele realmente precisarmos. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

3 de novembro de 2008

Sobre pais, filhos e heranças

Série “O dinheiro e os relacionamentos” – 3ª. parte


Publicado em 20/9/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro




A coluna de 23 de agosto trouxe o seguinte comentário do leitor AMARAL: “... Realmente as pessoas estão apegadas demais a dinheiro, só pensam nisso, perderam os valores... Imagine que, perto de minha casa, um pai nem havia sido enterrado e já estavam brigando pela partilha de bens.”

Amaral,

Quando morre um pai ou uma mãe, esperamos ver os filhos tristes. Foge a nossa compreensão que, num momento assim, os pensamentos deles estejam voltados para algo diferente de saudade. Entretanto, nem sempre é o que acontece. Por esses dias, li, num livro Espírita, que as relações familiares costumam ser complicadas porque cada indivíduo se manifesta de forma única; e que natureza e educação conspiram para criar um efeito de superposição entre as criaturas, mas os ajustes ainda não são perfeitos, embora um dia venham a ser não obstante a ignorância que nos cerca e preenche. Não conheço a história por você trazida, mas, no que se refere ao relacionamento entre pais e filhos, acho que valem certas observações.

Penso numa criança como alguém que sofrerá a influência dos adultos que a cercarão e da sociedade como um todo, mas que, ao nascer, já trará uma bagagem formada ao longo de muitas vivências. Assim, não é possível prevermos a forma como esse ser vai lidar com dinheiro, por exemplo. Ela poderá estar ou não de acordo com a criação que a ele for dispensada, porque não temos o controle que imaginamos ter sobre nossos filhos. Isso não significa que podemos simplesmente “lavar as mãos” e deixá-los por conta própria. Ao contrário, temos o dever de caprichar, sem perder de vista que eles aprendem principalmente com nossos exemplos.

Vivemos num mundo cada vez mais exigente quanto a “ter”, em prejuízo do “ser”. Além disso, idealizamos, para nossas crianças, uma vida materialmente tranqüila. Por essas e outras é que tanta gente se empenha em acumular. Quem deixou bens é alguém que já os tinha e se preocupou em preservá-los, pelo menos em parte, ou que construiu um patrimônio, tentando ser previdente. Mas há quem já inicie a vida profissional pensando na aposentadoria, na velhice, na morte, no que deixará para os filhos que possa vir a ter. Em outras palavras, estamos sujeitos a errar na dose e, não raramente, trabalhamos tanto que mal olhamos para os nossos filhos. Daí que eles podem crescer com uma visão bem distorcida do valor de coisas como relações familiares e dinheiro, independentemente de serem eles mesmos os alvos de nossos esforços e boas intenções.

Não dá para afirmar que foi isso o que aconteceu com seu vizinho. Mas não é nada difícil localizarmos, em nosso cenário, pais que, tentando escrever certo, terminam se atrapalhando nas linhas tortas e passando aos filhos a idéia de que era esta sua única ou principal missão com eles – a de prover de matéria. Assim, uma vez que eles deixarem de existir fisicamente, perderão essa capacidade e, portanto, o valor. Seus lugares passarão a ser ocupados pelos bens que puderem transmitir aos herdeiros.

Só não se ressintirão com tudo isso aqueles que conseguirem se movimentar de acordo com suas crenças mais íntimas, que fizerem pelos filhos mais do que a sociedade prescreve, que deles respeitosamente nada esperarem e que deixarem a vida com o sentimento do dever cumprido. Valeu, Amaral! Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

21 de outubro de 2008

Nossas crianças e as drogas

Publicado no site do Correio Braziliense em 19/10/08, Editoria Brasil


Muito já tem sido dito acerca do que leva as pessoas a consumir drogas e a começar cada vez mais cedo. Falam no nosso mundo louco; na falta de autoridade por parte dos pais; no desejo de pertencer a um grupo; na facilidade de se conseguir drogas; na desestruturação familiar, na curiosidade. Mas tem uma coisa que não me sai da cabeça e que quero compartilhar com vocês contando uma rápida história.

“Toda segunda-feira, logo que chego ao trabalho, começo a ouvir as pessoas contando como foi o fim de semana. E, sem exagero, só ouço o seguinte: “Bebi todas”, “Começamos a beber de manhã e só paramos no final do Fantástico”. E esse tipo de comentário se estende até terça. São dois dias ouvindo gente se vangloriando por ter bebido demais. Na quinta-feira, recomeçam as pérolas: “Tá chegando o finde. Vou beber todas”, “É beber, cair, levantar e voltar a beber”. Frases assim vão até o final da tarde de sexta. Os sábados e domingos são dedicados à bebida, que subsidiará os papos das próximas segunda e terça.”

Essas pessoas têm filhos, netos, irmãos, sobrinhos, crianças e adolescentes que vêem aqueles que lhes deveriam dar bons exemplos desperdiçar pelo menos um terço da semana dizendo que vão beber até cair, outro terço bebendo até cair e o último terço dizendo que beberam até cair. E o que é pior - muitos pegam bebezinhos ainda de colo e fazem questão de dar a eles um golinho “só pra batizar”, sem pensar que, naquele momento, pode estar nascendo um alcoólatra, alguém que, se ainda não os tem, desenvolverá sérios problemas emocionais e transtornos mentais, que escancarará as portas da sua vida infeliz para outras drogas e que, mesmo sem querer, levará adiante uma terrível maldição.

Ainda ontem, perguntei ao meu filho, que acabou de completar 20 anos, o que ele achava que leva os jovens a começar a beber e a se drogar cada vez mais cedo. Dele ouvi que fica difícil um jovem não beber vendo adultos bebendo, assim como fica difícil uma criança não beber vendo jovens bebendo. Ele está certo. Isso sem falar nos pais que fumam maconha porque acham que ela não faz mal; nos que cheiram cocaína pensando que os filhos nada percebem; nos que tomam um “uisquinho” toda noite pra relaxar; nos que fazem uso indiscriminado de tranqüilizantes, anoréxicos, diuréticos, antidepressivos, ansiolíticos, miorrelaxantes.

A vida das crianças e dos adolescentes não é nada fácil. Muita gente diz ter saudade desse tempo, mas penso que poucos são os que realmente têm do que lembrar com nostalgia. São fases difíceis, em que estamos a mercê de adultos nem sempre saudáveis e quase nunca preparados para nos orientar; em que uma série de crenças ilógicas nos são empurradas goela abaixo; em que raramente temos alguém com quem compartilhar nossas aflições. E é por esses motivos que noventa por cento dos adultos que me procuram no consultório trazem sofrimentos que carregam desde a infância. E se tudo isso ainda for regado a álcool e drogas, não fica difícil imaginar o resultado.

Pais amorosos e preparados não estão isentos de, um dia, precisarem enfrentar a dor de ver ou saber um filho drogado, mesmo porque uma criança é alguém que, ao nascer, já trará uma bagagem formada ao longo de muitas vivências. Mas, se somos pais, devemos caprichar, sem perder de vista que os filhos aprendem principalmente com nossos exemplos.

Maraci Sant'ana

13 de outubro de 2008

Leituras mentais

Publicado em 13/9/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


A Época de 11 de agosto trouxe matéria intitulada A nova classe média do Brasil. O texto começa com a pergunta “Classe média, eu?“ formulada por Josineide Mendes Tavares, manicure de 34 anos que mora, com dois filhos pequenos, na Favela da Rocinha. Embora a entrevistada pareça surpresa, essa família, segundo a revista, enquadra-se no que a Fundação Getúlio Vargas – FGV aponta como a nova classe média brasileira – pessoas antes consideradas pobres ou muito pobres, que começaram a usufruir confortos como televisor moderno, assinatura de TV a cabo, freezer, lavadora de roupas, computador, videogame e celular. A reportagem aborda a importância da pesquisa para, entre outras coisas, o desenvolvimento de políticas públicas e traz diferentes opiniões a respeito da fórmula utilizada para se chegar a essa classificação.

Há pesquisadores que usam como critério apenas a renda, enquanto outros consideram o patrimônio, a ocupação ou o nível de escolaridade dos pesquisados. Talvez outra instituição identificasse Josineide num grupo diferente. De acordo com Época, a maioria das pessoas entende que pertencer à classse média significa ter filhos estudando em boas escolas particulares, carro e dinheiro para uma pequena viagem de fim de semana por mês. Isso quer dizer que, independentemente do conceito que tenhamos a nosso respeito, sempre encontraremos pessoas que nos verão mais ou menos da mesma forma e outras que nos qualificarão de modo bem divergente. Estamos expostos a inúmeras classificações, já que cada indivíduo é único e, assim, tem uma visão singular de si mesmo e dos outros. Só que não é aí que mora o perigo.

Ainda nesta semana, eu conversava com um amigo que não se conforma com os sentimentos que pensa que o pai nutre por ele. Ele se sente incompreendido, injustiçado mesmo, usando, como medida para suas conclusões, frases soltas ditas pelo pai. E, numa situação assim, não é nada difícil desenvolvermos mágoa e até mesmo ódio. Além disso, se nos considerarmos mal interpretados, tenderemos a tentar mostrar ao outro que ele está cometendo um erro e que seu juízo precisa ser alterado. Mas o que encontramos muito, nesses casos, são criaturas tentando fazer leitura mental, ou seja, querendo adivinhar o que se passa na cabeça do outro, a partir de “sinais” que, para muita gente, não teriam nenhum significado. Meu amigo está classificando o pai de injusto. Talvez outro filho, diante da mesma situação, nem se abalasse ou tivesse uma visão oposta com relação aos sentimentos desse pai. Tal qual acontece em pesquisas como a da FGV, o que é relevante pra uns pode ser irrelevante pra outros.

Tive um casal de pacientes que, durante uma sessão, percebeu o quanto ambos faziam uso de leitura mental e como estavam enganados com relação ao outro. A mulher tinha certeza de que o marido odiava a filha que ela teve no primeiro casamento, pelo jeito seco dele lidar com a garota. E ele acreditava que ela adorava um cachorro que era dele, pela preocupação que ela demonstrava nos cuidados com o animal. Foi interessante ver a surpresa dos dois não apenas quando o marido revelou que gostava da menina e até tinha mais carinho por ela do que pelos dois filhos que ele havia tido com a companheira anterior, mas também quando a mulher confessou não gostar de cachorro.

Na maior parte do tempo, não sabemos direito nem sequer o que está passando pela nossa cabeça e, mesmo assim, nos arvoramos em adivinhos dos pensamentos e sentimentos dos outros. É aí que o perigo mora, no que imaginamos que o outro pensa a nosso respeito e, principalmente, em como nos vemos, que se reflete em tudo isso. É claro que nunca devemos desprezar o que nos grita o nosso instinto. Entretanto, muitas vezes, o que falta é uma boa conversa, daquelas em que não apenas falamos, mas também ouvimos. E você? Já fez sua leitura mental de hoje? Valeu, irmã! Até sábado, leitores!


No próximo sábado (20/9), a parte 3 da série O dinheiro e os relacionamentos. O tema que será abordado foi sugerido por um leitor que, assim como outros, comprou a idéia de ser co-autor. As partes 1 e 2 podem ser lidas no arquivo do blog, em 23 de agosto e 6 de setembro, respectivamente. Aguardo a visita e os comentários de vocês.

Maraci Sant'Ana

6 de outubro de 2008

A bomba AMOR x DINHEIRO

Série “O dinheiro e os relacionamentos” – 2ª. parte


Publicado em 06/9/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


O tema desta 2ª. parte da série foi sugerido pela leitora Suzana, que, em 23 de agosto, já na qualidade de co-autora, fez o seguinte comentário “... Gostaria de sugerir a você uma análise sobre quando uma mulher é mais bem-sucedida no trabalho do que o marido. Tenho uma amiga que está sofrendo muito com isso. O marido dela só faz desmerecê-la, joga o moral dela no chão. O que é isso?”

Suzana,

Lembra que cabia ao nosso avô sustentar a família? Se a vovó trabalhasse, era apenas por prazer, geralmente com algo ligado a prendas domésticas, e o dinheiro ganho, ela o usava para “os seus alfinetes”. É claro que, nos últimos quarenta anos, o papel masculino mudou de maneira radical. Mas isso não aconteceu porque o homem assim o quis e muitos resistem até hoje, não aceitam que as mulheres têm vez e voz. Até mesmo os que se julgam bem-resolvidos podem dar uma escorregadela e cair de bunda no machismo. Além disso, a gente vive num mundo em que dinheiro é poder.

Durante séculos, o homem foi o dono da situação. Seu poder era incontestável. Ele tinha o controle do dinheiro, dos bens, e da vida da mulher e dos filhos. Hoje, vemos mulheres que ganham tanto ou mais do que seus parceiros. Entretanto, muitas delas vivem relacionamentos de abuso, em que se sentem pequenas, inadequadas e até desequilibradas, graças a críticas e insultos que podem ir de ataques sutis a ameaças óbvias. Impossibilitados de usar a força do dinheiro, muitos homens tentam controlar a mulher de outras formas, menosprezando suas opiniões, sentimentos e realizações profissionais, mesmo que o trabalho dela seja a única fonte de renda da família. É muito difícil para quem vive esse processo ou para um observador leigo entender uma situação assim. Daí surgem os questionamentos como o seu, os conselhos que a mulher não consegue acatar e, o que é pior, as críticas que, em lugar de ajudá-la, tornam sua vida mais difícil.

Há algum tempo, recebi uma paciente que tinha um excelente emprego, casa e carro próprios, casada com um homem já perto dos 30 anos que vivia correndo atrás do “negócio da China”, mas que era por ela sustentado. Para ela, pelo menos em princípio, a situação vivida não era um grande problema. A dificuldade estava em suportar que ele, volta e meia, esbravejasse que ela tinha a vida ganha, enquanto ele tinha que ralar. Parecia que ela havia herdado tudo. Só que o emprego lhe viera por concurso público e os bens eram resultantes de muito trabalho. Para você ter uma idéia, a pressão era tanta que ela chegou a pensar em vender o que tinha, pedir demissão e tentar uma vida bem modesta, para que ele não mais se sentisse diminuído. Um verdadeiro absurdo, não? E o que ela não sabia é que isso não resolveria nada, só agravaria as coisas.

Essa combinação relacionamento amoroso e dinheiro é explosiva. E muitas situações podem levar um homem a agir assim com a parceira. Dificuldades diversas na infância, como um pai que usava o dinheiro para controlar as pessoas à sua volta, uma mãe opressora, o isolamento emocional ou a rejeição podem explicar, embora não justifiquem. Mas, a chave de tudo está na resposta às seguintes perguntas: O que leva sua amiga a se manter nesse relacionamento? Por que nada que ela faça para melhorar a relação dá certo? Fica claro, pelo menos pra mim, que ela precisa entender muito bem o que está vivendo e que, provavelmente, vai necessitar de ajuda profissional para isso. Lembre-se de que as pessoas só nos fazem o mal que nós permitimos que elas nos façam. Valeu, Suzana! Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

A sugestão da Suzana, que propiciou a coluna de hoje, enriquece a nossa série. Assim, continuo contando com a participação de todos. As novas idéias para texto poderão ser deixadas na própria coluna, sob a forma de comentário, ou encaminhadas para
maracisantana@yahoo.com.br, sem nenhuma preocupação quanto à privacidade. E quem perdeu a 1ª. parte poderá lê-la no arquivo deste blog, em 23 de agosto.

Maraci Sant'Ana


30 de setembro de 2008

O poder do dinheiro

Série “O dinheiro e os relacionamentos” – 1ª. parte

Publicado em 23/8/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro



No sábado passado, esta coluna anunciou que, hoje, teria início uma série de textos quinzenais sobre como o dinheiro interfere nos relacionamentos. A publicação provocou comentários postados no blog e a mim encaminhados por e-mail. Mas o leitor José Stélio nos trouxe uma idéia que podemos usar como ponto de partida. Ele disse que o dinheiro passa a ser um problema quando se torna dono da pessoa. E aí, eu pergunto: “Como algo inanimado pode se apossar de um ser humano?”

Felicidade geralmente é confundida com sucesso financeiro. Para muitos, a vida se resume a negócios, status, o que dá ao dinheiro um enorme poder. Qualquer conflito nessa área costuma ser de difícil solução, principalmente se nele estiverem envolvidas pessoas que mantêm ou mantiveram um relacionamento próximo. Os desentendimentos podem ser sobre gastos, contas não pagas, perda de emprego, pensões. Vemos homens que precisam estar no controle; mulheres que se vingam gastando ou acusando o parceiro de não procurar melhorar; maridos ressentidos com o sucesso da esposa; filhos matando os pais para receber a herança.

Muitos se lembram da novela Pecado Capital, exibida pela Globo na década de 70, cuja música de abertura, composta e gravada por Paulinho da Viola, tornou-se um dos maiores sucessos do artista. Ela diz que dinheiro na mão é vendaval na vida de um sonhador, que muita gente aí se engana e cai da cama com toda a ilusão que sonhou, e que a grandeza se desfaz, quando a solidão é mais, como alguém já falou. Mas que é preciso viver e viver não é brincadeira não. Que quando o jeito é se virar, cada um trata de si, irmão desconhece irmão. E que, aí, dinheiro na mão é vendaval, dinheiro na mão é solução e solidão.

Essa música pode nos dar uma idéia de como a possessão acontece. Ela fala que o dinheiro pode provocar um vendaval, um tumulto interior em um sonhador, alguém que não está em contato com a realidade, um despreparado, um iludido que, pressionado pelas cobranças da vida, perde-se a ponto de desconhecer o irmão. Ela não diz que isso acontece a todo mundo ou pode ocorrer com qualquer pessoa. Em outras palavras, o turbilhão não depende do dinheiro, mas daquele em cujas mãos ele está ou não está. Assim, sempre que o dinheiro se colocar entre nós e outra pessoa, sempre que ele se apresentar como um empecilho a um relacionamento saudável, deveremos nos perguntar que sentimentos estão envolvidos na situação. A conduta de alguém com relação a dinheiro nunca é isolada, mas um reflexo de sua personalidade. E as brigas por dinheiro raramente são apenas por dinheiro.

Noutro dia, li, na Época, pergunta feita ao consultor de investimentos Mauro Halfeld que dizia mais ou menos assim: “Meu noivo propôs um acordo pré-nupcial e me senti meio ofendida. A família dele tem uma situação financeira melhor que a minha e me senti excluída. O que fazer?”. Minhas perguntas são: será que qualquer noiva se sentiria ofendida e excluída como essa? Será que uma outra poderia considerar a proposta de acordo muito natural? Será que uma outra poderia até mesmo se antecipar ao noivo e propor o acordo, considerando a diferença entre as famílias, exatamente para evitar que essa questão viesse a ser um problema para o casal algum dia?

A idéia da série é exercitarmos esse tipo de reflexão, para que os verdadeiros problemas, que estão escondidos nesses conflitos, venham à tona. Só assim poderemos encará-los e dar a eles uma solução. Eu acredito que, a partir de situações concretas, teremos mais sucesso nessa empreitada. Então, convoco todos os que se interessam pelo assunto a participar, enviando seus questionamentos, contando suas experiências.

Os interessados em ser co-autores da série poderão usar o próprio nome ou um pseudônimo, postar um comentário no blog ou enviar mensagem para maracisantana@yahoo.com.br, sem nenhuma preocupação quanto à privacidade.

Fico aguardando notícias de vocês. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

23 de setembro de 2008

As bolhas das rodadas

Publicado em 30/8/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


A Veja publicou, neste mês, entrevista em que Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs) teria dito que “A diplomacia brasileira apostou todas as suas fichas no G20 e em Doha. E falhou duplamente”. Para o empresário, o governo errou não apenas por ter negligenciado acordos bilaterais, na esperança de que os países ricos diminuíssem os subsídios bilionários, mas, principalmente, por ter relegado a solução de mazelas internas, bem mais determinantes para o desenvolvimento do agronegócio.

Segundo o entrevistado, se erradicasse a febre aftosa, por exemplo, o Brasil poderia elevar em 1 milhão de toneladas a venda de carne de porco – o equivalente a dez vezes o ganho potencial com Doha; se o nosso sistema de rastreamento de animais tivesse credibilidade, poderíamos aumentar em muito as exportações de carne bovina para a Europa; se tivéssemos uma vigilância sanitária eficiente, poderíamos alavancar as exportações de frutas. Para ele, nosso sucesso depende mais da solução de problemas domésticos que de negociações comerciais complexas. No Brasil, houve uma glamourização da Rodada Doha, uma expectativa de que, a partir dela, o país fosse alçado ao Primeiro Mundo.

Sem entrar no mérito dessas questões, o cenário apresentado parece com o da educação no Brasil. Há uma glamourização do curso superior, mas a realidade não tem o menor charme. As crianças, em especial as que dependem da rede pública, terminam o ensino fundamental como analfabetas funcionais - conseguem juntar letras em palavras, mas não sabem ler. Dali, seguem para o ensino médio, de onde saem totalmente despreparadas para o vestibular ou o mercado de trabalho. Assim, os jovens que precisam ganhar a vida encontram enorme dificuldade para conseguir até mesmo subempregos. Pressionados, tentam investir num curso superior, que se lhes apresenta como uma tábua de salvação.

Totalmente sem chances de ingressar numa boa universidade, menos ainda numa gratuita, caem nas garras das instituições que se multiplicam mais do que ratos e oferecem cursos ruins e caríssimos, a partir de um vestibular que até um estudante em coma é capaz de superar. Em geral, o resultado disso tudo é uma avalanche de pessoas com diploma de curso superior, mas sem competência para disputar uma boa colocação, que, desiludidas, continuarão nos subempregos. Isso se não tiverem desistido, no meio do caminho, falidas, incapazes de pagar as exorbitantes mensalidades.

Será que não seria melhor investir na educação básica, realmente preparando as crianças para o ensino médio? Será que não seria melhor se essa segunda fase fosse também uma preparação profissional, que permitisse a todos, além de tentar o vestibular, encontrar um lugar no mercado de trabalho? Um país como o Brasil precisa muito de técnicos. O serviço público e as indústrias que aí estão e que vêm chegando, por exemplo, têm vagas para esse pessoal. Aliás, bons alunos de boas escolas técnicas costumam sair de lá já contratados. Uma vez com uma formação e um emprego digno, não ficaria mais fácil para esses jovens ingressarem numa universidade que valesse a pena? Será que, aí, não teríamos profissionais realmente superiores?

Penso que cuidar do ensino fundamental seria como erradicar a febre aftosa. Dar também uma preparação técnica ao jovem durante o ensino médio seria como investir em acordos bilaterais. Ingressar numa boa universidade já com uma base de conhecimentos, uma profissão e um mínimo de segurança financeira seria como fechar um acordo vantajoso numa rodada de negociações da OMC, como a Doha. Aí, sim, coisa de Primeiro Mundo. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!


Maraci Sant'Ana





15 de setembro de 2008

O capitalismo e o humor pelo mundo

Publicado em 9/8/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro

Tenho uma única irmã a quem sempre agradeço ao final dos meus textos - Maristela Sant’Ana. Como quase nada sei de economia, é a ela que recorro para checar se entendi corretamente os temas que pretendo explorar nesta coluna. Só então faço um link com a psicologia, esta sim minha área. Acontece que Maristela, além de jornalista, economista e minha consultora particular, é também bastante engraçadinha e me enviou um texto que muitos já devem conhecer, mas que creio mereça ser relido.

Capitalismo ideal: você tem duas vacas. Vende uma e compra um touro. O rebanho se multiplica e a economia cresce. Você vende o rebanho e se aposenta rico!; capitalismo americano: você tem duas vacas. Vende uma e força a outra a produzir leite de quatro vacas. Fica surpreso quando ela morre; capitalismo francês: você tem duas vacas. Entra em greve porque quer três; capitalismo canadense: você tem duas vacas. Usa o modelo do capitalismo americano. As vacas morrem. Você acusa o protecionismo brasileiro e adota medidas protecionistas para ter as três vacas do capitalismo francês; capitalismo japonês: você tem duas vacas, né?. Redesenha-as para que tenham um décimo do tamanho de uma vaca normal e produzam 20 vezes mais leite. Depois cria desenhos de vacas chamados Vaquimon e os vende para o mundo inteiro; capitalismo italiano: você tem duas vacas. Uma delas é sua mãe, a outra é sua sogra, maledetto!!; capitalismo britânico: você tem duas vacas. As duas são loucas; capitalismo holandês: você tem duas vacas. Elas vivem juntas, não gostam de touros, mas tudo bem; capitalismo alemão: você tem duas vacas. Elas produzem leite pontual e regularmente, de forma precisa e lucrativa. Mas o que você queria mesmo era criar porcos; capitalismo russo: você tem duas vacas. Conta-as e vê que tem cinco. Conta de novo e vê que tem 42. Conta de novo e vê que tem 12. Você pára de contar e abre outra garrafa de vodca; capitalismo suíço: você tem 500 vacas, mas nenhuma é sua. Você cobra para guardar a vaca dos outros; capitalismo espanhol: você tem muito orgulho de ter duas vacas; capitalismo português: você tem duas vacas e reclama porque seu rebanho não cresce; capitalismo chinês: você tem duas vacas e 300 pessoas tirando leite delas. Você se gaba muito de ter pleno emprego e alta produtividade. E prende o ativista que divulgou os números; capitalismo hindu: você tem duas vacas. Ai de quem tocar nelas; capitalismo argentino: você tem duas vacas. Você se esforça para ensinar as vacas a mugirem em inglês. As vacas morrem. Você entrega a carne delas para o churrasco de fim de ano ao FMI; capitalismo brasileiro: você tem duas vacas. Uma delas é roubada. O governo cria a CCPV – Contribuição Compulsória pela Posse de Vaca. Um fiscal vem e o autua porque, embora você tenha recolhido corretamente a CCPV, o valor era pelo número de vacas presumidas e não pelo de vacas reais. A Receita Federal, por meio de dados também presumidos do seu consumo de leite, queijo, sapatos de couro, botões, presume que você tenha 200 vacas. Finalmente, pra se livrar da encrenca, você dá a vaca restante para o fiscal deixar por isso mesmo...”

Tudo bem que a situação do mundo, de maneira geral, nada tem de engraçada. Mas o humor sempre teve e sempre terá um papel importantíssimo em momentos de crise pessoal ou coletiva. É maravilhosa essa capacidade de transformar em piada coisas como as próprias dificuldades, a falta de semancol dos outros, o autoritarismo, o fanatismo, o preconceito, as idéias absurdas. Isso, entre outras vantagens, reforça nossa reserva de energia, para aquelas horas em que não dá pra rir de jeito nenhum. Além disso, força-nos à autocrítica, encoraja-nos a novos olhares, promove catarses e estimula a solidariedade com aqueles que, por absoluta falta de uma veia cômica, mantêm-se oprimidos pela vida. Resumindo, rir é um grande e lucrativo negócio. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!


Maraci Sant'Ana


8 de setembro de 2008

As rodadas Doha de cada dia

Publicado em 2/8/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro

Fracassaram as tentativas de se liberalizar o comércio entre os países-membros da OMC. Sete anos de negociações, que deveriam abrir mercados, terminaram, nesta semana, em desilusão, literalmente derrubados por medidas protecionistas. Foram nove dias, mais de 100 horas de discussões intensas e nenhum acordo. Resumidamente, o desastre foi atribuído à intransigência de Índia e China, que não abriram mão de um nível alto de salvaguarda a seus agricultores e indústrias, e à inflexibilidade dos EUA, que exigiam acesso a esses mercados, em troca do corte de subsídios agrícolas. Chega a um triste fim a Rodada Doha.


É desanimador vermos desperdiçada uma chance histórica de se estimular a prosperidade do mundo em desenvolvimento. Mas a Rodada Doha também será lembrada como o momento em que restou claro que o poder não mais está concentrado na Europa e nos Estados Unidos, que empurravam suas decisões goela abaixo do resto do mundo. Países como Brasil, China e Índia agora têm vez e voz. É pena que tenha sido esse o preço da nova distribuição de forças, porque todos perdemos, em especial os países mais pobres, justamente aqueles que mais precisam de proteção, de salvaguardas especiais.


Mas o que aconteceu em Genebra não é muito diferente do que vemos todos os dias nas famílias, em que pais vivem em eterna negociação com filhos. De repente, um impasse que exige um acordo - ambos os lados acreditam estar com a razão e lutam para resguardar seus interesses. Dependendo, basicamente, do poder detido pelos envolvidos, e isso está condicionado a fatores como idade, situação financeira e amadurecimento emocional, as tratativas serão mais ou menos difíceis. Quanto mais desequilíbrio de forças, mais facilmente se chega a um “acordo”.


Quando os filhos são muito jovens e dependentes, as divergências são resolvidas com tranqüilidade para os pais, que, desavisados, mandam e desmandam, fazem e acontecem, às vezes agindo como ditadores, mesmo que bem-intencionados. Só que estes deverão lembrar que os filhos não ficarão pequenos e dependentes para sempre. Eles crescerão e chegará o momento em que os olharão de frente, olhos nos olhos, de igual para igual, agora, sim, também poderosos, tal qual os chamados países emergentes estão fazendo com os desenvolvidos. Quanto mais equilíbrio de forças, menos facilmente se chega a um acordo, embora este sim tenda a ser legítimo.


Dizem que os filhos vêm ao mundo para ocupar todos os espaços e a gente cá está, aguardando por eles, exatamente para evitar que eles ocupem todos os espaços. Portanto, essas situações fazem parte das relações entre pais e filhos. E a idéia é que, com elas, aprendamos a ser melhores como seres humanos. Muito do futuro desses relacionamentos está nas mãos dos filhos. Mas acho que a maior responsabilidade é dos pais.


Assim, sempre que nos defrontarmos com aqueles que estão sob nossa responsabilidade, lembremo-nos de ser firmes quando preciso, flexíveis se possível e amorosos sempre. A nossa postura como negociadores será determinante na daqueles com quem teremos de negociar mais pra frente. Porque os filhos aprendem não com o que dizemos a eles, mas com as nossas atitudes. Se soubermos ser justos, coerentes, flexíveis e amorosos, eles assim tenderão a agir, quando o poder migrar das nossas para as mãos deles. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!


Maraci Sant'Ana