29 de junho de 2009

See you later, Michael

Publicado em 27/6/2009, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


A notícia da morte de Michael Jackson, na tarde da última quinta-feira, surpreendeu o mundo. Todos queriam saber se ela era verdadeira, o que havia acontecido. A movimentação na internet foi tanta que travou o Google e o Twitter. E, com a triste confirmação, as manifestações não pararam mais. Pessoas comuns e famosas comentam e choram a perda do ídolo. O Rei do Pop parte nos deixando boquiabertos, como sempre. Fica para trás uma vivência marcada pelo sucesso e pelos escândalos, que o levaram da riqueza à ruína financeira.

Fala-se em parada cardíaca provocada pelo excesso de trabalho e pelo abuso de medicamentos. Não sabemos ao certo a causa da morte. Mas sabemos a importância que Michael teve para a indústria do show business. Sabemos que foi um dos maiores fenômenos musicais de todos os tempos, um prodígio, um artista completo, que compunha, cantava e dançava como poucos, um talento inquestionável que deixa saudade, especialmente em quem, como eu, cresceu acompanhando sua carreira, desde os tempos do Jackson Five.

Ousado, polêmico, irreverente, esquisito, genial, ele ganhou e perdeu verdadeiras fortunas ao longo de meio século de vida. Movimentou e continua movimentando somas incríveis. Off the wall bateu quatro vezes o topo da Billboard; Thriller, que custou US$ 750 mil, ultrapassou a marca de 109 milhões de cópias vendidas; We are the world, que ele compôs em parceria com Lionel Richie, arrecadou milhões para crianças carentes da África. Os números na vida de Michael Jackson são surpreendentes. Seus shows batiam recordes de público. Ele teve cinco álbuns entre os mais vendidos e ganhou 25 Grammys. Os shows da turnê que encerraria sua carreira deveriam ser assistidos por cerca de 1 milhão de pessoas e lhe renderiam mais de US$ 200 milhões.

Michael era descrito como bom, educado, gentil. Não fumava, não bebia, não usava drogas ilícitas e não comia carne. Mesmo assim, a vida dele foi definida, por um de seus ex-assessores, como uma jornada autodestrutiva. Seu estilo extravagante; as sucessivas cirurgias plásticas que, em lugar de lhe trazerem o rosto dos sonhos, transformaram sua aparência em um pesadelo; os casamentos inexplicáveis, primeiro com a filha de Elvis Presley, depois com uma enfermeira desconhecida que lhe deu dois filhos; a contratação de uma mãe de aluguel para o nascimento do terceiro filho; e os acordos em processos judiciais por acusação de pedofilia abalaram ainda mais sua estrutura emocional e a financeira, levando-o ao isolamento social e o obrigando a vender o rancho Neverland, assim como parte dos direitos autorais sobre as músicas dos Beatles. Segundo publicado por jornais de todo o mundo, ele deixa dívidas que totalizam cerca de US$ 400 milhões.

Mas quem foi de fato Michael Jackson? Um homem negro que desejava parecer uma mulher branca? Um garoto que, tal qual Peter Pan, vivia na Terra do Nunca e se recusava a crescer? Algoz ou vítima? Criminoso ou doente? Alguém capaz de, deliberada e conscientemente, trair a inocência de uma criança? Ou uma das muitas pessoas que não conseguiram superar nem as próprias dificuldades nem as decorrentes de uma infância de violência e abuso, que tentava desesperadamente preencher um vazio que mais e mais aumentava?

Talvez jamais saibamos a verdade. Mas a biografia de Michael aponta para uma família grande e pobre em que o pai trabalhava como operário e tentava uma carreira musical que nunca foi pra frente. Obcecado, Joe Jackson passou a investir nos filhos, que se mostravam talentosos. Abusivo e violento, buscando fortuna e sucesso, roubou-lhes a infância, submetendo-os a ensaios exaustivos, controlando, exigindo e castigando-os severamente quando as coisas não saíam da forma como ele queria – um verdadeiro calvário. Só Deus sabe o que acontecia entre aquelas quatro paredes.

É importantíssimo que os pais incentivem os filhos, que os ensinem a serem persistentes e disciplinados. Além do mais, dinheiro costuma cair muito bem, especialmente para um casal que vive na maior dureza, com nove crianças, como era o caso dos Jacksons. Mas fico pensando em como teria sido a vida de Michael se o pai tivesse visto nele, acima de tudo, um filho, que deveria ser acolhido com amor. Ou se a mãe tivesse tido a coragem de defendê-lo, de protegê-lo, mesmo do pai. Será que aquele garoto não teria se tornado um adulto emocionalmente maduro e equilibrado, capaz de se aceitar como era, em condições de encarar e resolver os problemas do mundo real, que não precisasse se esconder atrás de máscaras cirúrgicas? Será que ele não estaria vivo e com saúde suficiente para criar os próprios filhos?

Noutro dia, li que ninguém deveria ter filhos por necessidade, para aliviar a solidão, dar sentido à vida tentando reproduzir a si mesmo em uma cópia, ou buscar a imortalidade lançando um germe seu no futuro. Sábias ponderações. Porque os filhos não vêm ao mundo para atender as nossas expectativas. Aliás, devemos sempre esperar deles sonhos próprios e mais elevados que os nossos. Acho que o ideal é que nós comecemos ensinando a eles e que, o quanto antes, eles já estejam nos ensinando. Esse pode ser um bom indicativo de que cumprimos nossa missão. Como dito por Gribran, em O Profeta, nossos filhos não são nossos filhos, são os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma. Valeu, Michael!

Maraci Sant'Ana

15 de junho de 2009

Valeu, Tina!!!!

Publicado em 2/5/2009, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


Ontem, 1° de maio, celebramos o Dia do Trabalho. Temos todo tipo de data comemorativa em nosso país. Algumas são mundiais e bem conhecidas. Outras, nem tanto. Há a da confraternização universal, o Natal, a da chegada do ano novo, o dia das mães, o dos pais e o das crianças, a Páscoa e o São João, por exemplo. Mas há também o dia do supermercado, o da saudade, o do telefone, o da juventude, o do disco, o dos solteiros, o do anunciante e por aí afora. Uns bem loucos, não?

Hoje, 2 de maio, é dia do ex-combatente e do taquígrafo. Pouca gente sabe disso. Já o dos psicólogos, comemoramos com os corretores de imóveis em 27 de agosto; os economistas celebram em 13 de agosto; e os jornalistas, com os corretores, os médicos legistas e a saúde em 7 de abril. Mas há uma figura que termina sendo esquecida, embora também tenha seu dia – o trabalhador doméstico. Vinte e sete de abril não deveria passar em branco. Não há um só dono de casa que não saiba o valor de se ter um bom profissional para apoiá-lo no dia a dia do lar, doce lar.

Eu bem o sei. No próximo 10 de junho, eu e Tina completaremos 12 anos de uma grande parceria. Parece que foi ontem que ela chegou, indicada pelo porteiro do prédio em que eu morava, o seu Antônio. De lá pra cá, vivemos muitas coisas. Ela me ajudou a criar meu filho, assim como eu, de uma maneira diferente, a ajudo a criar Vitor Hugo e André Luiz. Passamos por momentos felizes e também de sufoco. Rimos, choramos, brigamos e nos acertamos, duas mulheres crescendo juntas, uma batalhando ao lado da outra. Muita gente cruzou meu caminho nesse período, mas poucas pessoas são ou foram tão significativas. Não posso nem imaginar o quanto teria sido difícil sem ela, sua comida caprichada, sua disposição e disponibilidade, seu apoio, sua alegria, seu carinho.

Só que, lamentavelmente, esse tipo de relação não é tão comum. E o lado trabalhista ainda é bastante problemático. Conforme publicado no site do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do Município de São Paulo – STDMSP, dos 6,8 milhões de trabalhadores domésticos, apenas 27,1% possuem vínculo formal de trabalho. Dos 2,3 milhões que trabalham como horistas, nem 10% contribuem para a previdência social. Mas há uma luta por jornada de trabalho estabelecida, hora extra, adicional noturno, salário-família e FGTS obrigatório. E, segundo especialistas e representantes de empregadores e trabalhadores domésticos do estado de São Paulo, o custo dos encargos deverá dobrar, caso isso venha a se concretizar.

É claro que vai pesar pra muita gente, mas todo trabalhador acha o máximo ter seus direitos garantidos, mesmo porque eles são o resultado de discussões ferrenhas e até de mortes. E, se podemos tê-los, por que não aqueles que estão ao nosso lado, fazendo o que não podemos, não queremos ou não sabemos, tornando possível que nos dediquemos a outras atividades? Sei que muitos trabalhadores, embora já tenham garantidos esses direitos em lei, não os usufruem de fato, pelo menos não na totalidade. Quantos, por exemplo, não ultrapassam a jornada sem hora extra? Já fiz isso tantas vezes que perdi a conta. Mas há os que conseguem. É nesses que devemos nos espelhar. E o que desejamos de bom para nós devemos querer pra todo mundo.

O começo nunca é fácil. Pode até haver desemprego. Mas, com o tempo, as coisas sempre chegam onde têm de chegar. Tudo se acomoda. Foi assim com trabalhadores de outras categorias. Por que não com os domésticos? Por que sustentar uma situação que é flagrantemente injusta?

Assim, a você que ainda reluta nessa matéria, peço que procure se colocar no lugar desse trabalhador, de seu parceiro. Acredito firmemente que pior do que os erros que cometemos por ignorância são os acertos que deixamos de perpretar quando podíamos, mas para o qual fechamos egoisticamente os nossos olhos. Valeu, Tina! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

1 de junho de 2009

A Parte mais Sensível

Publicado em 25/4/2009, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


Crise mundial – queda na atividade econômica e, consequentemente, na arrecadação de tributos. Cenário nada bom em qualquer período e especialmente ruim em época de campanha eleitoral, como a que já estamos vivendo. Veio daí a necessidade de se adotarem medidas para, pelo menos, minimizar o estrago. Surgiu a idéia de se reduzirem impostos sobre alguns produtos, como automóveis e eletrodomésticos da chamada “linha branca”, para dar mais impulso à economia; e a de aumentar a tributação sobre cigarro e bebida alcoólica, para garantir os cofres.

Segundo o site G1, a prática de onerar esses produtos quando a coisa aperta não é nenhuma novidade. Já no ano passado, membros do governo defenderam o aumento da cobrança de tributos sobre bebidas e cigarro, como forma de compensar a perda de arrecadação sofrida pela extinção da CPMF. Além dos significativos valores arrecadados, esse tipo de medida soa como em prol da saúde pública. O governo mata dois coelhos com uma “caixa d’água” só. Um primor de idéia.

De acordo com estudos do Banco Mundial, o aumento nos preços de produtos derivados do tabaco é uma das políticas de controle com melhor custo/efetividade, principalmente entre a população jovem e a de baixa renda, que são mais influenciadas pelos preços em suas decisões de consumo. E é público e notório que o tabaco é a droga que provoca mais mortes no mundo, sendo responsável por 90% dos casos de câncer de pulmão. Hoje, no Brasil, o número de óbitos causados pelo tabagismo é de 200 mil por ano. E nem estamos nos referindo à morte de pessoas que não fumavam, mas conviviam com fumantes.

E quanto à bebida alcoólica? Posso começar falando sobre algo que tem sido discutido no país inteiro desde o ano passado – A Lei 11.705/2008. O site do Correio de ontem trouxe a notícia de que, após 10 meses da chamada Lei Seca, o Detran registrou 73 mortes e 71 acidentes fatais a menos nas vias do DF. Além disso, foram autuados 3.000 motoristas por dirigirem alcoolizados. Desses, 1.228 apresentaram índice de álcool no sangue acima de 0,3mg/l. A gente treme só em pensar nas mortes que não puderam ser evitadas em todo o Brasil.

Para mim, esse resultado é mais do que suficiente para banirmos a bebida alcoólica do país. E, quando falo banir, falo de eliminar para todo o sempre. Pareço exagerada? Mas não é só no trânsito que a bebida mata. Um percentual enorme, que calculo 70%, das tragédias que vivenciamos todos os dias, não aconteceria se o álcool não fizesse parte de nossa história. Quando lemos aquelas notícias pavorosas de homens que assassinaram suas esposas, namoradas ou ex-companheiras; de filhos que mataram os pais; de pais que abusaram sexualmente das filhas; de mães que atiraram filhos recém-nascidos pela janela; de irmãos que brigaram até a morte; de assaltos violentos; de estupros, ficamos horrorizados, mas muitas dessas barbaridades teriam sido evitadas se os envolvidos nesses dramas, nessas situações-limite estivessem sóbrios, limpos.

É claro que sempre haverá quem queira me corrigir dizendo que o problema não está no consumo, mas no abuso. Então, eu me permito esclarecer, e falo como profissional da área de saúde, que muita gente não deveria beber nem sequer um copo de cerveja; que o mundo está cheio de alcoólatras em potencial que nem imaginam que não precisarão de vários porres para se transformarem em doentes de fato – basta um primeiro copo que desperte o gosto pela bebida. Isso sem falar que o álcool é, reconhecidamente, a droga que abre as portas da vida do indivíduo para outras ainda mais devastadoras.

Há alguns meses, numa entrevista para a TV, a repórter perguntou se eu era a favor de restringir a propaganda de bebida para após as 22 horas. E eu respondi que acho que esse tipo de mensagem deveria ser terminantemente proibida. Nós vivemos em um mundo que não precisa de nenhum estímulo a mais para beber. O que se ingere e o que se gasta com bebida é uma loucura. Seria uma maravilha se tivéssemos a certeza de ser economicamente viável a transferência dos impostos que incidem sobre comida e remédio, ao todo ou quase, para o cigarro e a bebida. Será possível? Melhoraria a saúde e a vida do povo, diminuiria o consumo de drogas, as tragédias, as mortes.

Diferentemente do que muitos imaginam e apregoam, fumo e bebida alcoólica não são supérfluos. São danosos, nocivos, devastadores, porque destroem, arruínam pessoas, famílias, civilizações. Por isso estou feliz com as medidas adotadas e com as notícias do que está por vir nesse sentido. E estaria muito mais se o aumento da tributação tivesse sido motivado não pela crise econômica, mas pelo desejo de se tentar evitar as tragédias a que assistimos diariamente, pela conscientização dos que governam, pela necessidade de se salvar vidas. Só que, ao que tudo indica, os governos são como as pessoas que ainda têm o bolso como a parte mais sensível do corpo. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana