Publicado no Tribuna do Brasil de 16/3/2007
Caderno TBPrograma, Coluna Psicoproseando...com Maraci
Quem não conhece "Crônica de uma morte anunciada", de Gabriel García Márquez, deveria lê-lo. Logo no início, o autor revela o final - a morte do protagonista. Só que essa morte é meio posta de lado pelo leitor, que se deixa envolver pelo poder cativante da trama. Conforme avançam os capítulos, a profecia se apresenta como inevitável. Mas quem lê se agarra à esperança de que o escritor mude o epílogo e impeça aquela morte absurda, embora pressagiada. Uma situação semelhante à vivida por muitas mulheres.
Neste mês, comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Muitas são as conquistas. Mas, o mais importante, a mulher ainda não alcançou - a consciência de que nossa sorte está em nossas mãos. Se as coisas vão bem, temos crédito nisso. Se vão mal, também. Não podemos continuar atribuindo nossas dores apenas aos outros, na posição de vítimas inocentes ou reféns sem opção. Precisamos assumir a responsabilidade pelo bem e pelo mal que nos rodeia.
Muita gente, equivocadamente, entende que estou culpando as mulheres pelo que de ruim lhes acontece. Isso não é verdade. Mas precisamos assumir nossa responsabilidade nos processos, para buscar evitar o problema e não apenas tentar resolvê-lo quando instalado. Se entendermos que somos responsáveis pelo rumo que toma nossa vida, nela atuaremos de forma mais inteligente, produtiva.
Imagine uma mulher que se envolveu com um homem que tem um comportamento intimidativo. Ela não tem culpa por ele ser como é. Mas, se ela se mantiver na relação, estará assumindo parte da responsabilidade pelo que possa acontecer. Isso não o exime de nada. Mas, se ele a agredir, ela será também responsável pela agressão porque teve a oportunidade de romper o relacionamento com alguém que dava sinais de ser perigoso, mas não o fez.
Agora, procure imaginar uma mulher que se envolveu com um viciado em jogo. Ela não tem culpa por ele ser como é. Mas, se vier a se casar com ele, estará assumindo parte da responsabilidade pelo que possa acontecer. Isso não o exime de nada. Mas, se um dia ela precisar vender seu único bem para saldar as dívidas dele, será também responsável pelo prejuízo porque poderia ter evitado o casamento com alguém que dava sinais de ser irresponsável, mas não o fez.
E o que você me diz de uma mulher que se envolveu com um homem que flerta abertamente com outras, comportando-se de forma desrespeitosa? Ela não tem culpa por ele ser como é. Mas, se mantiver o relacionamento, estará assumindo parte da responsabilidade pelo que possa acontecer. Isso não o exime de nada. Mas, se um dia ele a trair, ela será também responsável pela dor que sofrer porque poderia ter rompido um relacionamento que tudo indicava que terminaria em infidelidade, mas não o fez.
Essas mulheres, como os leitores de García Márquez, deixaram-se envolver pelo poder cativante do relacionamento, acreditando num epílogo diferente, embora o desfecho tenha sido predito. Se não quisermos ler nada que termine na morte do protagonista, devemos interromper "Crônica de uma morte anunciada" ainda no primeiro capítulo. Se não quisermos viver um amor que termine em dor, devemos interrompê-lo tão logo o triste final seja prenunciado.
Essa conscientização é difícil, mas é possível. Para isso, sempre que algo ruim me acontecer, deverei me perguntar: Qual foi minha participação nesse episódio? Identificando minha responsabilidade, estarei me mantendo no processo, não à margem. Poderei agir para mudar. E, de uma próxima vez, não incorrerei no mesmo erro. Estarei mais madura, melhor preparada, com as mãos mais firmes nas rédeas do meu destino.
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