Publicado no Tribuna do Brasil de 25/5/2007
Caderno TBPrograma, Coluna Psicoproseando...com Maraci
É impressionante como nós, muitas vezes, envolvemo-nos em situações problemáticas de uma tal forma que perdemos a capacidade de enxergar nossa vida como um todo. Ou será que nos envolvemos nessas situações por termos perdido essa capacidade? Nesta semana, ouvi de uma paciente uma frase que ouço com freqüência no consultório: "Eu preciso arrancar esse homem da minha vida".
A autora dessa frase me procurou, há uns meses, infeliz com um relacionamento amoroso que já durava cinco anos, embora o parceiro nunca tivesse sido como o por ela sonhado - amoroso, companheiro, comprometido, fiel. E há muito ela vinha lutando, sem tréguas, para mudá-lo, transformá-lo para que ele finalmente entrasse de verdade na vida dela.
Com o tratamento, as coisas foram mudando e ela enxergou que aquele tipo de relacionamento era tudo o que ele tinha a oferecer, nem mais nem menos. Também entendeu que ninguém muda ninguém, que o máximo que podemos fazer é ajudar alguém que queira efetivamente mudar. E ele não tencionava modificar seu modo de ser ou viver.
Uma vez convencida de que nunca conseguiria fazer com que ele entrasse na vida dela, a paciente decidiu romper o romance. Entretanto, isso não estava nos planos dele, que não mostrou a menor disposição para abrir mão dela e de um relacionamento que, para ele, era bom. A partir daí, ela iniciou uma luta para se afastar totalmente.
Uma mulher, um homem, um relacionamento, dois momentos diferentes, duas lutas - a primeira, para trazê-lo para junto; a segunda, para mandá-lo para longe. Desejos antagônicos e um só objetivo - a felicidade.
O que ela não entendia é que, tanto numa luta, quanto na outra, estava focando, obsessivamente, aquele homem. Ela não entendia que a vida dela é muito mais do que precisar desesperadamente mantê-lo perto ou precisar desesperadamente mandá-lo para longe. Ela não entendia que, enquanto investia em uma dessas duas batalhas, estava deixando de lado outras tão importantes quanto e, assim, enfraquecendo-se mais e mais.
Lembro de já ter dito neste espaço que quem mora em Brasília está acostumado com os prédios construídos sobre pilotis. Dá pra imaginar um edifício estruturado sobre uma única pilastra? Mesmo que alguém conseguisse ou tivesse a coragem de fazer algo assim, não seria temeroso? Já pensou o que poderia acontecer à obra se, por exemplo, um caminhão batesse no pilar?
Assim é com a vida da gente, que deve estar assentada em diferentes colunas como a da família original, a dos amigos, a do relacionamento amoroso, a da profissão, a dos estudos, a da religião, a do lazer. Se a construirmos apenas sobre o relacionamento amoroso, como no caso, e essa relação um dia acabar ou ficar ruim, ficaremos como um prédio cuja única pilastra foi atingida por um caminhão. Mas, se ela tiver sido edificada sobre várias colunas, as demais nos sustentarão enquanto consertamos a que estiver com problemas.
Incapaz de afastar esse homem definitivamente, por ainda estar muito presa a ele, mas consciente de que se condenar por essa incapacidade de nada lhe servia, a tal moça tomou a sábia decisão de desviar dele os holofotes. Passou, então, a iluminar outras pilastras - voltou a trabalhar, ao artesanato que mantém como hobby, à igreja que gostava de freqüentar, aos antigos amigos. Voltou a viver.
Chegará um dia em que ela dele se desligará totalmente. Mas, até lá, mesmo que venha a escorregar no que diz respeito a isso, não mais sofrerá como antes. Agora, ela enxerga muito além do que ainda não tem ou conseguiu realizar. Agora, ela tem onde se apoiar. Até sexta-feira!
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