“Toda segunda-feira, logo que chego ao trabalho, começo a ouvir as pessoas contando como foi o fim de semana. E, sem exagero, só ouço o seguinte: “Bebi todas”, “Começamos a beber de manhã e só paramos no final do Fantástico”. E esse tipo de comentário se estende até terça. São dois dias ouvindo gente se vangloriando por ter bebido demais. Na quinta-feira, recomeçam as pérolas: “Tá chegando o finde. Vou beber todas”, “É beber, cair, levantar e voltar a beber”. Frases assim vão até o final da tarde de sexta. Os sábados e domingos são dedicados à bebida, que subsidiará os papos das próximas segunda e terça.”
Essas pessoas têm filhos, netos, irmãos, sobrinhos, crianças e adolescentes que vêem aqueles que lhes deveriam dar bons exemplos desperdiçar pelo menos um terço da semana dizendo que vão beber até cair, outro terço bebendo até cair e o último terço dizendo que beberam até cair. E o que é pior - muitos pegam bebezinhos ainda de colo e fazem questão de dar a eles um golinho “só pra batizar”, sem pensar que, naquele momento, pode estar nascendo um alcoólatra, alguém que, se ainda não os tem, desenvolverá sérios problemas emocionais e transtornos mentais, que escancarará as portas da sua vida infeliz para outras drogas e que, mesmo sem querer, levará adiante uma terrível maldição.
Ainda ontem, perguntei ao meu filho, que acabou de completar 20 anos, o que ele achava que leva os jovens a começar a beber e a se drogar cada vez mais cedo. Dele ouvi que fica difícil um jovem não beber vendo adultos bebendo, assim como fica difícil uma criança não beber vendo jovens bebendo. Ele está certo. Isso sem falar nos pais que fumam maconha porque acham que ela não faz mal; nos que cheiram cocaína pensando que os filhos nada percebem; nos que tomam um “uisquinho” toda noite pra relaxar; nos que fazem uso indiscriminado de tranqüilizantes, anoréxicos, diuréticos, antidepressivos, ansiolíticos, miorrelaxantes.
A vida das crianças e dos adolescentes não é nada fácil. Muita gente diz ter saudade desse tempo, mas penso que poucos são os que realmente têm do que lembrar com nostalgia. São fases difíceis, em que estamos a mercê de adultos nem sempre saudáveis e quase nunca preparados para nos orientar; em que uma série de crenças ilógicas nos são empurradas goela abaixo; em que raramente temos alguém com quem compartilhar nossas aflições. E é por esses motivos que noventa por cento dos adultos que me procuram no consultório trazem sofrimentos que carregam desde a infância. E se tudo isso ainda for regado a álcool e drogas, não fica difícil imaginar o resultado.
Pais amorosos e preparados não estão isentos de, um dia, precisarem enfrentar a dor de ver ou saber um filho drogado, mesmo porque uma criança é alguém que, ao nascer, já trará uma bagagem formada ao longo de muitas vivências. Mas, se somos pais, devemos caprichar, sem perder de vista que os filhos aprendem principalmente com nossos exemplos.