19 de agosto de 2008

Grau de Investimento

Publicado em 12/7/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro



O bicho tá pegando desde a última terça-feira, quando a Polícia Federal prendeu, na boca da madruga, entre outros, Daniel Dantas, dono do Opportunity, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e o empresário Naji Nahas, acusados de se unirem em quadrilha para desvio de verbas públicas, crimes financeiros, corrupção e lavagem de dinheiro. A operação recebeu o nome Satiagraha, tal qual o movimento de resistência sem violência à ocupação britânica da Índia proposto por Mahatma Gandhi.

De lá pra cá, as opiniões sobre o trabalho da PF se dividiram - há quem elogie a ação como um todo; há quem enalteça a investigação, mas considere as prisões desnecessárias ou censure a forma como elas foram feitas; há quem discuta a legalidade e a conveniência de alguns aspectos, como o uso de algemas e armamento pesado, além da presença da imprensa; e há, até, conforme noticiado neste blog, quem defenda Daniel Dantas.

Além disso, já li e ouvi que tudo isso só está acontecendo porque este ano é de eleições; porque a Polícia Federal faz, do seu trabalho, um espetáculo, numa espécie de jogada de marketing institucional que se mostra muito útil, especialmente em época de reajuste salarial; e, até, que, no Congresso, a maioria dos parlamentares de oposição considerou a ação um capítulo do “jogo do poder dentro do PT”.

Entretanto, é inegável o fato de que a maioria da população delira com essas operações. Muita gente se sente vingada, de alma lavada, com as notícias da prisão de peixes graúdos. E, além da expectativa de que a ação da polícia iniba outros golpistas, que se sentiriam desencorajados, há um sentimento de totalidade e preenchimento resultante, segundo pesquisadores, de um senso biológico de justiça.

Não dá pra não pensar que, enquanto alguns têm, em casa, um milhão de Reais só pra pagar propina a servidores públicos, faltam recursos, por exemplo, nos hospitais como a Santa Casa de Belém, onde mais de 60 bebês morreram no último mês; faltam recursos para a Polícia Militar treinar os soldados, para que eles, por total despreparo, não matem a tiros as criancinhas; faltam recursos para construir escolas de alvenaria, para que possamos tirar nossas crianças de construções de lata, infernais no verão e gélidas no inverno – faltam recursos para saúde, segurança e educação.

De nada nos adianta vermos bandidos dessa espécie atrás das grades por meros “15 minutos”. O que efetivamente vai resolver é vermos a grana voltando aos cofres públicos, dinheiro de corrupção revertido em favor da sociedade, o mercado financeiro funcionando sem distorções, pessoas investindo sem medo, os sistemas trabalhando sem falhas e uma legislação moderna, compatível com o mundo em que vivemos e com as espertezas dominantes.

O desejo de vingança nos é praticamente inevitável. Somos seres ainda muito ignorantes espiritualmente e nos deixamos assaltar até mesmo por sentimentos que, ao menos lá no fundo, consideramos moralmente pobres. Mas a revanche, como a mentira, tem pernas curtas. O que deve nos interessar, o que devemos exigir é justiça. Nós não somos Gandhi, mas temos cá nosso Satiagraha. Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

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