17 de novembro de 2008

As máscaras e a lava

Série “O dinheiro e os relacionamentos” – 4ª. parte

Publicado em 4/10/2008, no site do Correio Braziliense, Blog do Vicente Nunes,
coluna A Psicologia e o Dinheiro


Desde 23 de agosto, quando foi publicada a 1ª parte da série, chegam comentários inspiradores. Um deles foi postado pela leitora Sandra, que disse o seguinte: “... acho dinheiro muito bom. E, em minha opinião, não é ele que interfere na vida das pessoas. Simplesmente o dinheiro revela o caráter das pessoas. Quem tem caráter continua a ser uma pessoa correta, independentemente da quantidade de dinheiro que tem. Agora, os que são mau-caráter se revelam rapidamente quando o dinheiro entra no meio.”

Sandra,

Há muitos anos, quando ainda cursava Psicologia, um professor me disse que a gente não conhece o parceiro quando com ele se casa, mas quando dele se separa. Em outras palavras, é nos momentos de crise, ou seja, de desequilíbrio, dúvidas, tensão, conflito, transição, que as pessoas se mostram como são. Temos, então, a oportunidade de saber se e, também, o quanto a criatura que se nos apresenta naquele momento tem a ver com aquela que acreditávamos que ela fosse. Tudo pode acontecer! Em situações como a que você citou, dizemos que a pessoa se revela como é verdadeiramente.

O ser humano é gregário por natureza. É na vida em sociedade que aprendemos e ensinamos. E graças a essa troca é que efetivamente crescemos. Só que, para conviver, precisamos desenvolver algumas características que, aqui, chamarei de máscaras. Sem elas não seríamos pelos outros suportados, assim como também não toleraríamos nem sequer nossos pais e filhos, pelo menos não no nível em que o conseguimos agora. Sem as máscaras que hoje usamos, as relações seriam mais tumultuadas. São elas que nos permitem aceitar os outros e sermos aceitos pelos diversos grupos a que pertencemos.

Entretanto, apesar da óbvia utilidade, as máscaras não costumam ser bem-vistas. Com elas vem a idéia de fingimento, de algo artificial, não-natural. E, considerando que somos seres da natureza, a de que elas não se sustentam todo o tempo ou em qualquer situação. Sempre chega o momento em que caem, por não terem o poder de anular, apenas de disfarçar o que em nós é incompatível com a vida em comum. Assim, tal qual a lava no momento da erupção, tudo o que se tentava esconder sob a máscara vem à tona. Creio que foi isso o que você quis dizer quando escreveu que as pessoas revelam, rapidamente, seu caráter mau.

Temos aqui duas idéias – a de máscaras e a de lava. Ambas nos incomodam porque deixam claro que os seres humanos temos uma parte aceitável, mas também uma inaceitável. E, por mais que nos consideremos sociáveis, não podemos negar que temos nossos “pecados”. Como todo mundo, em alguns momentos, em determinadas situações e com certas pessoas, somos admiráveis. Em outras oportunidades, somos horríveis, podendo ter comportamentos idênticos àqueles que não suportamos nos outros, que tanto nos incomodam, indignam.

As máscaras são instrumentos de que lançamos mão para caminhar da forma menos rude possível até que delas não mais precisemos. E a lava é que indica, com precisão, sem rodeios, as máscaras que nos estão faltando e o que necessitamos mudar em nós mesmos. Se eu acreditasse na existência do mal, diria que ele não habita nem as máscaras nem a lava, já que tudo está a serviço da nossa transformação em criaturas plenas. Valeu, Sandra! Valeu, irmã! Até sábado, leitores!

Maraci Sant'Ana

Nenhum comentário: